Reveses Revistos
2020
fotografia
dimensões variáveis
Série Plan y contraplan
2024
Monotipia
Tinta offset quadricromia sobre papel Canson 300g
29,7 x 42 cm (cada)
Projeto realizado durante a Residência Casaplan (Valparaíso / Chile), financiado pela Funarte, por meio da Bolsa Mobilidade Artística 2023.
O trabalho emerge como cartografia crítica das dinâmicas de poder inscritas no território de Valparaíso, Chile. Partindo de um mapeamento prévio das camadas históricas e econômicas da cidade — com ênfase nas zonas onde a preservação patrimonial (como a área tombada pela UNESCO) colide com a pressão da especulação imobiliária (Cerros Alegre, Concepción e região do Barón) —, elegi cinco formas geopolíticas que condensam essas tensões. Cada forma, mais do que um contorno geográfico, opera como dispositivo visual de regimes de visibilidade.
Na segunda etapa, submeti essas estruturas a um processo de “desmontagem gráfica” através da monotipia, técnica que, por sua imprevisibilidade e rastro fantasmagórico, ecoa a própria natureza ambígua do urbanismo neoliberal — onde projetos de "revitalização" apagam memórias enquanto produzem novas marginalidades. A escolha da tinta de quadricromia (CMYK) não é casual: ao utilizar o sistema cromático base do capitalismo gráfico, as imagens resultantes questionam como a cidade é reproduzida, empacotada e vendida como commodity cultural.
As sobreposições entre as formas — um cruzamento entre o mapa cadastral e a mancha de óleo — revelam fissuras: a UNESCO como agente de valorização turística, os cerros como fronteiras de classe, o Barón como zona de suspensão entre o abandono e a investida do capital. A monotipia, aqui, não é apenas método, mas metáfora material da impossibilidade de fixar sentidos em um território em constante disputa — onde até a preservação é forma de violência espacial.
O trabalho, assim, propõe-se como “arqueologia do presente”: ao transfigurar dados urbanos em paisagens gráficas, expõe como as geometrias do poder se inscrevem tanto no solo quanto no imaginário, convertendo corpos e morros em meros vetores de renda fundiária. Valparaíso, nesta leitura, torna-se um palimpsesto de ausências, e cada impressão, um testemunho do que é apagado para que certas verdades — turísticas, imobiliárias, patrimoniais — permaneçam intactas.
